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ENTREVISTA – Declínio da função paterna frente às exigências da vida moderna

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Psicóloga,  Psicanalista e Assistente Social, Sonia Rodrigues da Penha trabalha em Vitória/ES e é conveniada com a AJUDES. Com especializações para atuar no atendimento das questões que afligem o ser humano em seus relacionamentos, Sonia atua também na clínica de dependências químicas, nos distúrbios de comportamento e nas psicopatias. Agora aposentada nas atividades do Poder Judiciário, ela segue contribuindo na área da psicologia e da psicanálise. Nesta conversa Sônia nos fala sobre o declínio da função paterna frente às exigências da vida moderna.

O que temos de diferente na função moderna de paternidade?

Tenho me surpreendido no cotidiano das relações com expressões saudosistas que descrevem algo vivido e que hoje parecem suspensos, enquanto norte da boa convivência a serem preservados.  Escutei recentemente algo mais ou menos assim: “Eu sou da geração do por favor, bom dia, eu te amo, obrigado, do respeito aos pais e aos avós, de se pedir permissão, de saudar com um sorriso, de amar as pessoas pelo que elas são e não pelo o que elas me dão ou têm a me dar…”, e por aí vai com intuito de chamar atenção,  para o desvio intencional ou não, da verdade da mensagem  dita pelos indivíduos, quando dos encontros estabelecidos através dos laços sociais.

Para esta reflexão que proponho é necessário lançar mãos da contribuição daqueles que se dedicaram a sistematizar um saber que nos auxilia a  compreender por que isso acontece e quais as consequências disso para o coletivo de humanos, que passam a infligir algo que é de consenso de todos como uma lei universal.

 A partir de qual autor a senhora faz essa reflexão?

Utilizarei a contribuição de Freud e de seus seguidores para melhor esclarecer por que considero a quebra de tais convenções como parte do declínio da função paterna frente às exigências da vida moderna.

 Qual é o papel a ser desempenhado pelos Pais ou substitutos?

O filho do homem quando nasce é um dos seres mais frágeis do mundo animal, é o que mais necessita do investimento sistemático do outro para que possa sobreviver. O papel a ser desempenhado pelos pais e ou substitutos é determinante para introduzi-lo na estrutura da linguagem, dando significado  às suas formas de expressão para que ele se constitua um sujeito da fala, que   exprime um querer que precisa ser simbolizado.

A estrutura da linguagem é esse algo que se institui aí nessa relação, a partir dessa função paterna, capaz de ordenar o modo como cada um de nós se colocará em funcionamento nas relações sociais. Quando constituído a contento esse indivíduo estará mais preparado para lidar com as motivações, diferenças e proposições de seu cotidiano.

Qual é a importância da palavra nesta constituição do humano?

 A compreensão da importância da palavra dita ou não dita sobre acontecimentos da vida de cada um é imprescindível, pois esta palavra tem o poder de produzir marcas, tanto no presente como lá no passado e que na maioria das vezes, nem são percebidas, vai-se falando! Vai se repetindo uma fala, que vai se estabelecendo como uma verdade, que se bem dita é positivo, o contrário pode ser tão verdadeiro quanto.

Essas constatações, dizem respeito às relações construídas no cotidiano de todos nós, quando no desempenho de funções: de pais para filho, professor para aluno, chefe para subordinado…

 O que podemos chamar de declínio da função paterna e quais podem ser suas consequências?

Compreende-se como declínio da função paterna quando algo interfere de forma intencional ou não, comprometendo esse processo, fazendo com que esse pai não tenha força necessária para garantir ao filho a introjeção dos limites convencionados culturalmente pelo grupo social do qual fazem parte, deixando esse filho sem esta referência e refém de si mesmo que a tudo quer, a tempo e à hora e ou que a todos ignora em detrimento de seu querer.  Uma realidade dolorosa em decorrência dos muitos tormentos que podem advir, principalmente quando constituídos de forma precoce nos primeiros anos de vida, quando ainda criança, que poderá repercutir mais lá na frente, quando adulto, na forma de sintomas graves.

 Como a vida moderna passa a interferir nessa construção?

As exigências da vida moderna, que estimula o indivíduo na  busca do ter como referência de felicidade e solução de  seus problemas, interfere sobremaneira nesta construção. Ao disseminar uma postura de indiferença, pouco ou não privilegia o tratar desse questão, às vezes até a fortalece ao fazer “ouvido moco” aos apelos de ajuda  e/ou de denúncia.

Então, o que buscamos cotidianamente em nossa existência?

Assim, enquanto ser da linguagem, o que cada indivíduo busca,  na verdade, é ser capaz de exprimir o seu desejo inesgotável de encontrar outro semelhante ou diferente dele e estabelecer com esse outro um encontro, uma comunicação. Desejo esse que por sua própria característica está para além do controle consciente, e que por conta disso poderá gerar vários equívocos e aquilo que realmente precisaria ser dito, não é comunicado.

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